quinta-feira, 25 de outubro de 2007

Tira-brisa de férias.

Tô trancado aqui no banheiro de azulejos encardidos, escrevendo para não me esquecer; como Narciso, que só se olha.
Banheiro me dá vontade de fumar, e quanto mais sujo o banheiro, mas eu decaio no fumo.
Fumo, que é o misto de coragem e menosprezo, é o causador daquele gosto amargo no canto da lingua.
O menosprezo é mal hálito, e pipoca velha no dente é como muita gente por aí, são lembranças que vem à tona por acaso.
Mas parecia que Dostoieviski estava lá e nos contou em encadernados verdes bem mais tarde. Na verdade, crime e castigo perde.
Era uma cozinha de azulejos engordurados... No espiritismo, as almas perdidas se alojam nos azulejos, feito gorduras. Por isso que ali pesava tanto, a desarmonia e a geladeira pifante moravam ali, numa fritura acre de acarajé, um cheiro quente e picante que ainda por cima fazia-me lembrar da porra da Bahia, e do tesão que eu sentia pelas negrinhas de sovacos semi-raspados.
Um cheiro de angustia no ar... mas, que nada. Angustia sôa frio, portanto não fede.
Aquela casa toda cheirava a dia perdido. a imundice capaz de chocar a unicef.
Ali era o meu tira-brisa de férias, onde eu ia me divertir um pouco. Não na casa_ ali eu mal sorria. Mas na cidade, onde eu nutria um carinho sem grandes palavras.
A cozinha era suja e escura, o meu colchão estava como sempre posto num chão sujo de cimento e terra, e martelo e prego e sujeiras.
Os lençois... bons lençois lavados pela primeira vez que eu estive lá e nunca mais, eu só não conseguia sentir o meu cheiro.
Mas os lençois estavam lá, no sofá azul, todos dobrados um por cima do outro, e enfim, por cima de uma almofada, dessas que ficam de enfeite na sala.
Era porque minha tia estava com sono, e o sono lhe dava o luxo de ser boa. As baratas caiam do telhado, passeavam por mim. Muitas vezes dormir com a certeza que no dia seguinte acordaria com a boca inchada como a da Angelina Jolie.
Eu ainda suporto me humilhar, economizar brio, ter pena. Pena daquelas pessoas desajustadas, naquela casa que um rouba o rivotril do outro havia viciados demais.
E as baratas caiam como chuva, o que estavavam fazendo no teto? os ratos passeavam a procura de espectros de comida.
Eu só ouvia o barulho se espatifando no chão, era tudo brêu, eu só esperava chegar, e andar pela cara plácida que eu só tento esconder com um lençol fino até ficar com falta de ar, e assim finalmente dar a cara para as baratas baterem.
Não podia acender a luz, também não podia ficar sem dormir, nada a temer.
Quanto mais eu conheço as pessoas, mais eu gosto de mim. São todos infelizes em suas camadas estáticas, em versões puritanas_quando não as mais sórdidas.
Quer saber?
Eu quero mais é que todo mundo mergulhe de cabeça em suas vidinhas razas.

Nenhum comentário: