sexta-feira, 20 de julho de 2007

Os Sisos.


Um cachorro me mordeu a boca.
Agora a pouco, no instante que era inofensivo, e que eu era indolor.
O cachorro dormia no meu colo, e o menino o beijava, e nada acontecia enquanto eu te segurava, e enquanto o menino te segurava a boca.
Eu varria as flores de outono que sujavam o meu quintal.
Havia sangue escorrendo na cidade, mas a gente nem ficava a pá, nem a enxada disso tudo, do efeito dos genéricos.
Do grande drama de Maysa.
Dos seus gametas.
Das suas urtigas.
O menino explorava seus pêlos enquanto o cachorro dormia.
Expulsava as pulgas e todo tormento.
Eu morria de sono... O cachorro já dormia.
Abriu sua boca no mesmo momento que despertou, eram olhos vivos e vermelhos, caninos afiados como o punhal em que todo mundo escolhe ao invés do cheiro intimo da flor, é porque dói mais.
"E dói porque é bom de fazer doer."
A situação era iminente a tragédia, e na minha mente o seu olhar_Uma espécie de caricatura marginal, me remete a um filme de terror, depois da morte, tudo o que fica são os olhos. E amanhã, depois do banho, eu irei esquecer, mas irei ser atormentado pela marca e pelo Dejá vù dos domingos.
Então.
Mordeu minha boca como se mordesse um bife.
Divago. Não há ódio quando se morde um bife.
Não doeu, mas o menino gritou,e as vezes ele gosta. Era um misto de vontade e desespero. Azia.
A boca presa em seus sarcasmos, ficou lá por horas, eu não sentia dor, mas gritei.

-Eu tomo Zooloft
-Você tem depressão é?
-Eu já tentei morrer duas vezes.
-Na verdade, eu não queria saber.
-Desculpe.
-Bem, de todo jeito, você ganhou de mim nas tentativas. Eu penso em morrer diversas vezes, mas é do meu trabalho, só para sentir as pessoas sofrendo por mim.
-Caramba, eu tambem era assim...
-A minha tentativa, na verdade, foi um ato de coragem e libertação, o livre-arbítrio.
Bah, sei que para os leitores mais exigentes, suicidio é covardia, mas enfim. Não gosto de me explicar, nem quero falar sobre isso com você, não hoje, quem sabe um dia... Quando eu estiver drogado e bêbado, eu citarei frases-feitas maravilhosas para você, até você se encantar com a minha genialidade juvenil e montar um fã clube para mim. Mas por favor, hoje não. Hoje eu estou circunflexo, hoje eu estou travessão.

Amornou-se.
O sangue jorrava de minha boca, e eu sujei a minha camisa do Velvet Underground. A vergonha tem o mesmo peso da dor taciturna e a mesma feiúra dos pés e das unhas cheias de bife. Pensava, nos 32 dentes estragados e em toda força que lá cabia.
Pois para mim, respeito é bom e mantêm os dentes no lugar.
Legalegalegal né?
O cachorro cuspia sangue, o cachorro cuspia ódio, o cachorro cuspia.
Levantou, deu uma de amor e abanou o rabo, foi procurar um canto menos sujo para dormir. Acabou por sair na chuva.
Enquanto os ratos correm da chuva, eu danço.
Eu fiquei limpando o sangue da calçada, e nem tomei injeção contra raiva.
Raiva, era esse o sentimento pelo menino não era?
Exagere mais um pouco. E isso é quase tudo.
É porque eu peso, tudo o que eu falo tem um peso tramontina.
Party Animal... Só porque eu tenho um bom estômago e ainda um pouco de pumão intacto, porque tomo vinho com creamer cracker, junto a fome com a vontade de beber.
Pois bem! Chega de golpes fracos! Vamos usar o punhal dessa vez! Não quero mais seus rastros nos meus cotovelos, não mais.
Sua presença não foge muito da companhia do meu uísque barato e amargo_que eu tomo com gelo para aliviar a culpa do alcoolismo. Que já acabou, que já não está mais aqui, que nem tem mais gotas, só a garrafa, algo puro de mim, de você e do menino, e do cão ou do cachorro, se assim queira.
Eu vou escrever minha dor, em tecidos de cetim, que não é honra nenhuma para mim.
Pois bem, e tenho dito!
Daqui para adiante, quem ousar me chamar, eu direi que não estou.
Direi que eu morri.
Overdose de drama.

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