quinta-feira, 30 de outubro de 2008

Maternité

Deus, a franqueza que semeio me destrói. Porque não poupo nem a mim mesmo? Tentei viver metade da minha vida de entorno, abstraindo pesadelos e não mais pensando no que fiz nem o que deixei de fazer, isso alivia a culpa.
Mas hoje não deu, hoje foi o fracasso do entorno, penso que sendo sincero comigo mesmo é uma recompensa por eu ser hipócrita com os outros.
hoje aproveitei a catarse e acertei um soco bem no meio do meu estômago, para ver se eu realmente agüento.
Fiz-me lembrar_com a crueldade de um torturador. da vez que eu vi meu filho semiformado boiando morto dentro da latrina, morto por emplasto contra úlcera. a minha namoradinha na epóca fez um aborto ingerindo citotec, porque eramos muito jovens, e eu aceitei porque pensava num futuro egoísta, sem procedentes.

ela me esperou por quatros meses para tomarmos a decisão juntos, que mal há em você escolher o que supostamente lhe faria melhor? erramos? erramos! mas e aí? aceito com parcimônia a tramoia do destino? os sonhos e a dificuldade, a corda no pescoço eu mesmo faço a gentileza pro carrasco, em colocar?
varamos a noite pela rua procurando sutilezas, alguem que nos fosse util, onde arranjar o remédio? qual é o nome do remédio mesmo? a quem perguntar? a namoradinha engoliu um comprimido de citotec e o outro enfiou na buceta, sem restrições. receita boca-boca.
e enquanto ela paria a morte cheia de dor eu acompanhava tudo_cheio de comiseração, fumando um cigarro no banheiro.
não me sentia tanto um assassino, sentia que havia feito a coisa certa. Mas hoje, depois de 3 anos me sinto mais perverso do que um assassino em sí, pela situação humor negro que nos foi pego de surpresa.
O que fariamos, uma vez que já tomamos juntos o veneno? esperamos morrer, certo? e uma vez que a criança estava lá boiando na latrina junto com os germes?
seria muita insensibilidade e frieza de caráter apertar aquela descarga, até mesmo pelo simbolismo que um sanitário representa. E as duas almas sabiam disso naquele metro quadrado de azulejos cheirando a anti-séptico. Por sorte, eu sou pratico. E penso que o que se perder se perdeu, e de quebra eu sou um gentleman.
Cometemos o mesmo crime, rolamos juntos na mesma lama porque um tropeçou no pé do outro.
ela me disse, assim choramingas: agora é sua vez. e eu, senhores do juri, eu fechei bem aqueles olhos de um garoto de 16 anos de idade e puxei a descarga,
quando eu abri os olhos, meu filho não concebido por mim não estava mais lá.
lá,
só havia o barulho da agua enchendo os canos da descarga novamente.

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