terça-feira, 29 de julho de 2008

Sou todo ouvidos.

Brincando de gangorra ou não, já se foram um mês. Ter a sensibilidade rara de sentir o tempo passar é uma virtude útil, as pessoas estão surdas, como Betthoven, e eu permaneço sem orelhas, assim como fez Van Gogh. Confesso que provoca o mesmo efeito que as pessoas capacitadas a adaptação costuma sentir.
A vida sempre me pareceu um produto barato de validade iminente, profetizada.
Mesmo assim ainda ouso provar o iorgute vencido, sem orelhas e com o pouco que me resta de simpatia para com o fino trato. Mesmo assim, vejo-me inconcebível ainda lá diante de todos, prostado na parede tentando prestar atenção no que eu ouço, todo mal é que só penso em mim, e me perco enamorando minha barriga. Minto. Não julgo isso de todo mal, você é quem está mais perto, ninguém mais do que você te conhece e te quer bem, porque o bendito e passado egoísmo veio com a criação. É mais ou menos como uma espécie de DNA, um cacoete que Deus inventou para todos nós, a prima distante das nescessidades fisiológicas e a irmã bastarda dos defeitos.

Todo mundo é egoísta.
Quantas vezes eu perdi de contar as tantas vezes que as minhas pernas deram um passo para trás, recuando o passo como um caranguejo e enrrolando a língua como um epilético, para dar vez a voz que falava, e eu esperava sem sentimentos, sem algum ressentimento me punhava em espera a hora em que eu pudesse punir.
Deveras, eu não era tão importante, minhas opiniões pouco se me dava se eu dizia, se eu criava uma estatura solida para ela. Bem... eu já as conhecia de có e ninguém precisa espantar minha preguiça com coreografias de brigas e "eu sei mais".
Não valia a voga se estariam ao meu lado ou contra a minha idéia, não me interessava, não valia a pena.
Nem sempre grande coisa era guardada em minha memória, a gente vai ficando gasto como sola de sapato, como se participasse de uma eterna maratona cotidiana e banal, assistida por nós de corpo exaurido por uma fina cortina de mosquiteiro para que deixasse a visão turva do que estaria acontecendo lá dentro.
Lá dentro que é pura proteção e sufoco.
A gente gasta como cifrão, como as pedras do Shangrillá, como o batom, como o cansasso, como a vista, como a inspiração que agoniza e perde o brilho, como a felicidade até tudo se reduzir apenas em costumeira alegria.

Sentirão todos aqueles que tem que sentir, tamanhas loucuras com o efeito de um ébrio. Irão se lembrar de velhos ansejos escondidos lá atrás da memória num estado natural de perfeita sonolência, a fina camada que separa o sonho da realidade quando a gente sonha, o cordão umbilical que estrangula o delírio e seduz o sono, como se o sono fosse mazoquista.
Irão vocês rebuscar, assim como eu rebusquei em minha periférica memória, andará trocando as pernas pelos guetos da mente e se dará com fantasmas e putas.
Nanicas cinicas de narizes achatados, sentirá uma imensa vontade de fodê-la outra vez, de mexer com aquela alma esquecida como pipoca velha no dente afim de ressucitar o gosto, porque é bonito ver uma mulher morrer de prazer em seus braços. A vontade só aumentará e você quase implora que ela lhe pague uma bebida ou lhe empreste um tostão.
Você sorri com o canto da boca enquanto ela gesticula aperfeiçoando toda a cena, para os souvenires que respiram e bebem atabalhoadamente. A vontade de chupar-lhe a buceta daquela mulher espalhafatosa chegará a um nível tão visceral que você sentirá vontade de gritar, procurando o mesmo efeito que se tem quando se quebra um grandioso espelho, quando se toca um violino num balé silencioso, quando se grita "Viva a Sérvia!" no torvelo de croatas, quando se interrompe um belo discusso, como quando troca de canal na hora do beijo, quando atropela as palavras, quando se berra de madrugada completamente aflito_ quere-rá sentir a sensação rasgante de iniciar a salva de palmas, ouvir e somente ouvir sozinho a o uivo sofrido da garganta expulsando a bílis num banheiro ecoado, sentirá o desejo de sentir o delicioso constrangimento de peidar em paredes geminadas na presença de bocas cessadas.
Só para ter certeza de que continua em qualquer ponto da sua vida, com as redes já gastas nas mãos, já gastas também. Como um tapa na cara que acorda o desacordado temporário.
Qualquer coisa, até a coisa mais ridicula serviria para quebrar a monotonia, a ficha que cai e faz você dar um salto para trás e ficar são por algumas horas e perceber que tudo ainda soa como uma armadilha.

Dou a vez ao próximo sem nem mencionar minha vez, me divertir é muito mais interessante do que ter que tomar partido de algum assunto e passar pelas três pedantes etápas:

Defender, dissertar (lê-se mastigar) e por fim, dissecar.
Achar que ninguém mais tem razão provoca a desavença, essa é a etápa do arroto, da escatologia, da porcaria filtrada pelo intestino, da bíle, da merdra, da sorte para os atores. Essa é a hora que eles se amontoam um em cima dos outros como abutres, como jogadores de beisebol lutando por uma bola oval.
O meu chefe e gordo senhorio, um mineiro gordo que transpira o tempo inteiro, que treme quando bebe e quando bebe muito dança e fala asneiras. Um glutão acovardado e honesto, eu tenho estima por ele, e um pouco de pena de sua situação, pena não seria a palavra ideal, pena requer uma dose de sentimentos verdadeiros, e tudo em mim ta misturado que eu não sei mais o que é verdade ou o que é blefe.
Por ser o unico a me levar em prostíbulos e me pagar biritas e sexo e falar francamente comigo criou-se uma estima que fazia encômodo para alguém que se sentia apenas grato. Eu assistia tudo de muito perto e isso não fazia bem as minhas vistas, sua mulher o expulsou da cama, do sexo e do coração, ele se esparrama sem cobertas no sofá da sala como sardões sem rabo nos cantos da parede. E como se não bastasse mais nada, sua filha nem o olha na cara e o seu filho caçula não é realmente seu.

Cada um vive do jeito que dar, e ninguém pode dar um jeito nisso.
A mulher que discutia com o meu patrón era uma intelectual arrogante e sem graça. Não me lembro exatamente da discussão, mas era por um motivo idiota, como todos prelúdios de guerra iniciada.
Discutiam sobre chicotes e bingas de boi, sobre surras de gato morto, sobre a Hebe.



Um comentário:

Guilherme N. M. Muzulon disse...

como um escritor, você despejou-se à folha, meu nobre amigo. Como escritor, parabéns.


um abraço