sábado, 14 de novembro de 2009

O alvo, o diálogo e o coro


Quem saca crime e castigo naturalmente também saca esforço e recompensa, certo?


Fiz uns bicos como ajudante de serralheiro. Não faço muita coisa, fico no auxilio, o serralheiro vai pedindo sem olhar pra você: chave 13... eletrodo... chave 11... troca o disco... liga a maquina de solda... liga a lixadeira... talhadeira... drena... martelo... pinta ali... recolhe as ferramentas... etc...


Recolhe as ferramentas, eu confesso, é a frase que eu mais gosto de escutar, porque quer dizer que o expediente acabou de acabar.


Hoje pintei a bandeira de um portão, levei 3 horas para dar primeira e segunda mão porque a bandeira era gigante, o todo dobro do tempo no banho para tirar todo aquele zarcão e o cheiro de solvente que desconfio, penetra até a alma.


Aí ganho uma grana razoável e vou esquadrinhar diversão, dilacerar alguns corazones_ enquanto o meu se mantêm intacto, enquanto o meu é o que eu tenho de maior e de mais solitário na vida_ dar um salto mortal no mar morto pra ver se dar onda. Ausente de tudo, a vida não tem me convidado para viver, não estou no tal momento em que todo mundo está, pelo contrário, estou sob o signo da monotonia. então... fale com a secretária.
Viajei até a provincia para prestigiar a primeira exposição de fotos de um grande amigo meu, fotos que faria o Sebastião Salgado se condoer.
Fiquei bêbado, pra variar.

E no bar reencontrei um cara gordo de aparência sebosa que é um asco quando está chapado, mas naquele dia ele estava terrivelmente sóbrio, enjoado com seus modos cívicos fajutos, bem vestido de bermuda sport e camiseta de tecido caro. Mesmo com todo esse truque de forte aparato e ainda todo papo frosô de que "oh sim.. a primavera realmente existe, mas não no Brasil, a primavera existe na Europa..."_ ele não conseguia esconder a verdadeira linhagem da qual ele precede, pelo menos não para os meus olhos.

Detesto gabolice, veja bem, repare que quem mais se gaba é quem nada tem, gabolice inventada é o fim dos tempos, um cú cagando na chuva. Detesto certas pessoas, mas sempre me cruzo com elas. Ontem entre umas e outras cervejas, 3 caras falando dos seus cifrões...: "Eu com 19 anos ja era gerente de não sei onde, aos 20 tinha minha pequena fortuna no banco."

e quieto eu fico concatenando myself com expressão Buster keaton na cara, mas na minha cabeça vou eliminando um por um: "Sei... o velho golpe do seguro desemprego, passa uns meses na empresa e pede demissão, não é por isso que você está desempregado agora? As empresas não mais lhe querem! e outra, quero a grana que você me pediu emprestado para pagar o seu curso de dpt. pessoal, tio patinhas."

seguinte!


O mais bêbado, esse mudava toda a expressão falando, como se estivesse relatando um filme de ação: "Reggae pra mim só com MUITA grana, 2 mil só pra gastar em bebida, putas e comida, eu boto pra fuder!"


de mim para comigo mesmo: "Infeliz de quem é triste... não consegue esconder a armagura de ter sido deixado para trás, a sua mulher o trocou por Alan Kardec, o morto-vivo. Beba, meu filho, bebamos à sua desgraça!"

seguinte!


O meu primo, ex cunhado do mais bêbedo: "Eu também já curtir altos reggaes, saca aquele filme Levando a vida adoidado? Perde pra mim, aquilo lá é fichinha... Muito dinheiro viu... Ô bons tempos..."


"Tem que ser esperto, mas você não sabe conservar, leva quem te usa a falência e fica a ver navios ao pular do barco, o que restou disso tudo? Algumas roupas de marca... hoje desempregado e caroneiro das chinfras dos amigos que realmente tem dinheiro. Tamanduá bandeira, pinguço e tio patinhas, eu não tenho nada financeiramente falando, mas sei de algumas coisas. Vocês rigorosamente não sabem de nada!"


Depois de tudo isso, abri a boca, tomei um gole da cerveja e pensei alto: "Embuste e cerveja quente, a noite ta uma merda!"
Cuspi a cerveja e arrotei com desprezo. Eu tenho desprezo ilimitado, desprezo para toda vida.


"A história é a seguinte: um nazista e um judeu. O nazista perguntou para o judeu: Você me despreza? e o judeu respondeu: Se eu pensasse em você, com certeza desprezaria."


O seboso de modos cívicos contava essa história no bar a luz de velas onde estavamos, a luz de velas por causa do apagão, mas eu estava mesmo foi achando hilário uma mulher com um casaco de lã de ovelha negra, que falava sobre um acidente que houve com ela: O carro perdeu o controle e desceu anarquicamente a ribanceira, e ela gritava: "Socorro, meu Deus! Eu não quero morrer!", Entenderam? Ela é a dona do famoso jargão do programa Na mira. ha ha ha! Isso implica uma chateação, ela dizia, esperava ser colocada em mármore no centro de um largo, afinal, o jargão ta na boca do povão. Impressionante como as pessoas são embusteiras quando bebem. Aqui, ali, em todo lugar.
O seboso é casado com uma mulher da high society, mas estava com o amante, um playboy que depena ele sem dó nem piedade; um rapaz jovem, bonito, de olhos esverdeados e a boca rosada de chupador de pica.



não a do seboso,é claro, esse ainda teria muito que penar... isso faz parte do clichê dos michês.


Esse seboso, vamos chama-lo de J. para facilitar a explicação (vamos chama-lo de J. até porque eu não sei o nome dele, sei, mas esqueci. enfim.)


J. estava de olho no garçom metido a engraçadinho da pizzaria cafona em que estavamos, eu estava de boaça na minha mesa falando com a garrafa e com uma mina que também era amiga dele... mas nosso dinheiro estava acabando, então...


O garçom vendia os cigarros dele a unidade por 50 centavos, porque na pizzaria não vendia, e onde vendia era extremamente longe, e porque era Carlton também. A maioria das pessoas sairam desprevinidas e estavam loucas para fumar, e só ele e EU tinha cigarros. O espertalhão tentou lucrar, mas eu quebrei a banca dele destribuindo cigarros pra galera que pedia encarecidamente, mas só para os que encarecidamente pediam.


Ele usava uma calça jeens justa que apertava a bunda grande e avolumava a coisa toda e uma camiseta branca escrita na frente GG e com uma seta apontada para o zíper da calça... Ridiculo.


Ornellas é o dono da pizzaria cafona, quando tudo estava calmo e as pessoas sussurravam notinhas de amor e melancolia ele subia no palco e entoava canções no karaokê,dependia do clima para as musicas, se ele sacava um casal in love, justamente cantava Feeling num inglês primário.


Quando Ornellas abandonava o palco, reversava com alguns poetas. Espera aí, um, dois, três poetas hoje, mas o que é que está acontecendo aqui? Abriram a porta do inferno?
O garçom disse que hoje teria um concurso musical de karaokê e os poetas eram as atrações dos intervalos, alguns fazia stand up, o primeiro ator contou que estava no elevador e soltou um peido, e o pobre que estava também no elevador perguntou: "Rapaz, respeite minha esposa, você não segura não?" e ele respondeu: "Eu não. Você segura?" e o cara disse: "Eu seguro sim." e o moleque encerrou com um peido: "Então segura mais essa". O povo ria de cuspir no chão e babar na mesa. Animado com a animação coletiva subiu mais outro no palco e ficou contando piadas longas, de bichas, de português, de louras, mas ninguém ria, ao contrario, o povo conversava e bebia. Eu só gosto de piadas de humor negro, fora isso nem começe. Finalmente o cara se retirou do palco e o palco ficou vazio por um bom tempo... até o garçom tomar partido do picadeiro, acho que faz parte do trabalho dele chamar atenção, vai saber.

Ele tinha escrito uma poesia uma vez bêbado e tinha decorado para hoje, mas o garçom era meio débil e ficava escorado no banquinho com a boca para o norte e o microfone para o sul, e ainda por cima falando baixo, e o povo gritava: fala mais alto!
Mas esse garçom está mesmo um porre, o que ele ta falando aí? Sobre uma mulher... mmm... buceta... não sei não, eu só ouvi "talvez ela seja uma cadela..." (?!)

Puta, que merda... Bukowski meu amigo, don´t try.


Eu tomei a iniciativo de fuga. "Ok. Vamos dar o fora daqui. Qualquer coisa é melhor do que isso, detesto poesia, poesias sobre vulvas? a não ser que o poeta tenha uma."

E eu, antes dos aplausos, tinha bebido o suficiente para sacanear publicamente um desconhecido: "Ô garça, você vestiu sua camiseta ao contrario rapaz! Essa parte da frente fica atrás!"


E todo mundo riu, e choveu aplausos naquela noite cafona.






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