segunda-feira, 8 de junho de 2009

Tá valendo




João não sei das quantas me causou uma grande impressão, uma impressão favorável, eu diria. Com o seu estado mental em perfeito estado, uma conversação cativa e uma inteligência mordaz. Ele ficava sensacional ali contando suas histórias de perrengues, temperadas em seu próprio molho. Era esquisito, um tanto alto e escarnecido, escarnecido e escarninho, de uma destreza nas palavras... Perfeito para um pândego! O olhar e a magreza dos canalhas era dele, a forma de costurar a conversa e arrastar inesperadamente o ouvinte para a linha de fogo era realmente admirável. As tatuagens esporadicamente espalhadas pelo corpo, feitas por fazer, sem a verdadeira intenção de marcar território, aquelas tatuagens com os seus símbolos particulares o denunciavam à subversão. Deviam ter histórias fenomenais cada uma delas. João tinha um cérebro e uma alma que funcionavam muito bem.
O que falavamos enquanto queimava o bec? Sobre uma excursão para a Chapada Diamantina, sobre certos lugares inusitados onde aviões podem cair e onde foi parar o Jardim do Edén afinal, e sobre a precisão da física quântica também. Por exemplo: Vocês sabiam que um carro pára quando capota? Vocês já viram um auto capotar? Um carro vai a 140 por hora e ele pára para cair por terra, numa fração de segundo imperceptivel, justamente porque ele tem que colidir com alguma coisa para tombar.

Não matei a minha curiosidade sobre os significados das tatuagens e nem imagino onde foi parar o Jardim do Edén, João diz que existe um lugar que é um verdadeiro paraíso, que um certo avião teve que pousar e pousou naquele lugar, o lugar era encantado, mas ninguém sabia voltar porque ninguém sabe exatamente o local. Mas isso não é Lost?

Essa resposta trata-se de uma questão cronológica, é só acompanhar a Biblia como se acompanha uma novela. Deus destruiu o mundo e o unico que foi poupado da fúria divina foi Noé e sua arca animalesca.

Eu sou totalmente idiota em conversações, pateticamente tímido e irônico fora de hora. Tenho inveja do João, tenho inveja do Noé também, aliás tenho inveja de qualquer pessoa que espontâneamente e por instinto sabe exatamente o que dizer para qualquer tipo de gente.

Uma prima bêbada fez um discurso lindo e todos pararam para ouvi-la. Mesmo bêbada falava muito bem, argumentava com perfeição, falava comigo, falavam de mim, eu virei assunto na roda, o prato do dia.
Não vou ficar aqui ruminando o lodo dos detalhes, vou escrever em suma; ela dizia que meu irmão e eu eram referência de inteligência para ela, me encheu de elogios, disse que eu era mais inteligente que o meu irmão (que aos 12, 13 anos escreveu um livro "polêmico" sobre a familia) Polêmico porque ditava alguns podres... mas o livro é de uma linguagem chula, valeu a intenção de uma criança de 13 anos, mas o livro é péssimo, bem ruim mesmo, e conta minha passagem pela epilepsia, o que não é legal.
Minha prima até chorou, disse que se eu nescessitasse mesmo de ajuda, que a procurasse, para pedir conselhos, para pedir carinho, um abraço amigo... e não que chafurdasse no meu elemento natural e sujo, nas drogas... e aquela merda total. Estavam agindo comigo como se eu fosse um marginal! Como se eu estivesse lambedo carpete, em fim de carreira.
Ah, me poupe. E eu tinha acabado de voltar de um restaurante, onde eu passei 9 horas em pé servindo as pessoas, louco pra fumar um cigarro. E ela me vem com mais essa.
Eu entendo a ajuda do sangue. É que certa feita minha, não deixei uma boa impressão na familia; meus pais haviam acabado de se separar, e eu comecei a tomar Rivotril+Birita, passei uma semana inteira tomando rivotril, feito um idiota. Mas o que acontece é que fiquei viciado no remédio, não me lembro de muitas coisas dessa epóca, me lembro vagamente sendo jogado no chuveiro com roupa e tudo, e de minha mãe chorando muito, e todas aquelas pessoas carpideiras me olhando e conversando baixo, pelos cantos. As pessoas me contam histórias... Bem, eu estava surtando de verdade, cheguei muito perto da loucura, e a loucura senhores, não é nada agradável como pinta Saramago, Raul Seixas ou Erasmo de Roterdã.

As pessoas não esquecem, os parentes fazem questão de te lembrar. Foi por isso que essa prima minha, naquela noite lutou verbalmente e de corpo presente pela minha sanidade como um asfixiado luta por ar.

Que imbecil que é tomar rivotril... Aldous Huxley escreveu que na fuga humana existe 1800 partes, não é possivel que eu não encontre um buraco onde eu posso me enfiar com dignidade.
Mas eu estava falando do João, não vou descarrilhar os trilhos... Eu ficava ali imóvel como uma mobilia, tão sem valor quanto um copo vazio em cima da mobília, dava mesmo valor as gargalhadas que me eram extraídas com verdade, e não para manter uma falsa sintonia de diversão. Afim de esconder o meu embaraçado pedantismo faço de minha língua comida de gato.
Sou aborrecível para alguns, para outros eu sou exatamente o que faltava, não se pode servir a Deus e ao Diabo no mesmo turno...

Contudo, eu sei admirar, como admirei o João. Só sei do João até aí, e é melhor parar por aqui, porque eu sei que de perto ninguém é lá grande coisa.
As primeiras impressões foram boas. Não é essa que vale?

Um comentário:

Guilherme N. M. Muzulon disse...

massa, muito massa bro.

um dia eu acharei o jardim do éden.