sábado, 27 de junho de 2009

City Down - Eu comi a Padilha


Como de praxe, fui visitar meu senhorio, cheio de segundas intenções. Escapei com a agilidade de um gato fugindo do banho de limpar escassos bambus, e aproveitei para visitar aquele Gárgula.
Os comprimentos parte de quem chega, o cafezinho é parte de quem estar.

"Aceita um cigarro, marginal? Que tal Keep Walking com batata frita? É o que tem aqui, tem Etta James também. Bebe! Pode beber que não é de Marujo não."

Marujo é o caboclo beberrão do senhorio, quando eu me hospedo lá, ele logo me avisa indulgente: "Não vai beber essa vodka não, se não quiser se ver com a fúria de Marujo mais tarde."

Mas naquele dia:

"E aí? Já foi despedido?"

"Três vezes."

"É bem você isso."

Clarice Lispector; a cadela, fez firula ao me ver. Limpou suas patinhas lamacentas em minha bermuda e lambeu a ferida do meu joelho provocada por um acidente pirotécnico da guerra de espadas da cidade. A propósito, nessa cidade acidente foi pouco, 85 feridos, mortos só de tiro.
Eu que socorri um rapaz que estava ao meu lado na batalha, quando uma espada cega veio voando e se espatifando na cabeça dele, sangue a jorrar pela cara, sangue suficiente capaz para salvar a vida de uma familia que espera doação, poderia ser eu o infeliz, poderia ser qualquer um. Eu que encontrei um olho humano na rua, eu é que sei. É tudo muito inacreditável, e o Guilherme pensa "Essa Bahia é mui louca".
Mas voltemos a falar da Clarice Lispector, o senhorio detesta Clarice Lispector, por isso pôs o nome na cachorra.

"Nossa, como Clarice ta desnutrida... Parece um cão de Bombaim."
Falei na intenção de dar uma deixa para a resposta sulfúrica do tipo: "É a crise."
Mas ele foi muito pior.

"É que ela ta fumando crack"

"Ou será que você não tem comida? Você também não está com uma aparência muito saudável... Está com um aspecto ralé."

"Não meu bem, aqui tem uma pacote de ração. Aceita um tira - gosto?"

"Não, muito obrigado. Ha ha ha"

"Já sei qual é a sua. Veio mendigar abrigo, acertei?"

"E ainda uso o desusado por favor."

"Olhe, ainda não aluguei a casa, portanto você pode ficar. Mas vou logo dizendo..."

SOBREAVISO:

"Nada de porta de boxe aberta, nem toalha molhada na cama, bebedeiras fora de hora nem pensar, se vomitar mire no penico da minha falecida tataravó que ta debaixo da cama, nada de armas brancas e gente maluca batendo na porta a sua procura tarde da noite. Drogas? Tô fora! Sou cool."

"Hum... muita exigência para uma casa tão cheia de moruins, tô todo me coçando aqui..."

"Isso se chama escabiose."

*****
Vocês não sabem, mas esse meu senhorio é uma peste, mui malvado. Não é nenhum personagem de Dostoievski, mas também não fica atrás nas pervesidades. Ele me acorda todo dia de uma forma insana: uma hora joga água, outrora põe uma bomba debaixo da cama e acende o pavio... Mexe nas minhas coisas, rouba meu dinheiro, me põe em encrencas diversas. Essa semana ele trocou a cor da tela do meu celular para "desagradável", e como saudação ele jogou: "Chupe meu cú"
Mais tarde, no mesmo dia, já acomodado em meus aposentos, lia enquanto a tarde se suicidava.
O quarto de hospedes não é muito grande: Uma cama, um criado - mudo ao lado, um guarda roupa antigo vinho tinto, com roupas velhas ao lado do criado, defronte a cama um biombo mais antigo que o penico da tataravó do senhorio, com umas imagens de santos e porta retratos antigos, uma imagem de gesso muito bonita de Marujo com uma garrafa na mão, ao lado de uma capela. Era nesse quarto super escuro que eu desabava a estafa.
Mas era na cozinha que as visitas do senhorio se reuniam para beber drinks, fumar maconha, cheirar cocaína, tomar chá de santo daime, assistir a novela das oito e ouvir Maria Calas no estéreo.
Ele e um monte de bichas playmobils que alugaram a casa ao lado logo se socializaram, e inventaram de emprestar o corpo para dar para as entidades se divertirem. Combinaram uma feijoada regada a muita, mas muita birita, só para os caboclos e para os visitantes da orgia espírita. Eles seriam como power rangers quando é hora de morfar.

"Vamos fazer uma feijoada que rende mais. Agora tem que ter muito alcohol."

"Mas isso é lógico! Para lubrificar a conversa! Ah, que tal se a gente convidasse Soraia?"

"Ah! Pra padilha dela vim, né? Claro! Quem tem o numero de Soraia, hein?"

Soraia veio, e eu fiquei. Ok, confesso que fiquei na orgia morrendo de medo do que poderia acontecer com aquele monte de entidades juntas, mas tomei coragem e fiquei porque algo me dizia que aquele evento seria uma experiência unica para mim.
E foi.
Soraia é uma mãe de familia, casada, com uma filha já adolescente. Uma coroa do tipo vitoriana, mas não é uma coroa muito gostosa, não, não era não, ela era baranga. Uma mulher tímida, realmente respeitável, sem dúvida do tipo vitoriana.
Mas a sua padilha tirou Soraia para Cristo no meio daquele inferno, tirou o dia para avacalha-la, coitada...
A Padilha entrou numas de beber conhaque e falar alto, era um festim etílico sem parcimônia. Completamente bêbeda gritava e tirava a roupa, roçava nos paus já duro dos visitantes e tirava roupa em cima da mesa, fazendo strip-tease, só não ficou completamente nua, porque alguns caboclos caretões não permitiram.
A Padilha fez churria comigo, foi chegando pro meu lado cheia de volúpia e eu correspondi seu beijo demorado, mordeu minha boca. Tirou a calcinha sem tirar a saia, me fez cheirar a calcinha, tomou de minha mão e pôs na mesa, e na frente de todos me pegou pelo pau e me levou pro banheiro, como quem leva um cachorro pra passear, pela coleira.
Começamos a nos pegar e ela me ofereceu o seu fedendo assim de cara, como começou a doer, sabe o que ela fez?

"Toma desgraça! Passa essa pasta senão vai arrombar toda a coitadinha!"

Eu comi o cu da Padilha à base de creme dental e aos urros no banheiro, e ela quebrou a pia.
Eu comi a Padilha e foi o sexo mais sensacional que eu já fiz.

*****

( Cinco minutos de recreio. )
A porta da rua me chamou a atenção por causa das lamúrias, uma gritaria aguda e oníssona. Era justamente um cortejo fúnebre de uma mãe de santo, passava aqui na porta os filhos e irmãos de santos, todos metido na alva e todos possuídos por santos, jogando pipocas por onde passavam, ao caminho do cemitério da cidade. Bem na hora que eu estava escrevendo sobre a minha transa com a padilha.
Incrível.

*****

Como lagarta, enquanto não vôo, eu rastejo. Me arrasto pra noite, pra qualquer lugar onde eu possa me diverti, fui a festa do picado ao miudinho, e lá algumas surpresas.
Eu penso que se eu fizesse tudo correto o resultado seria finalmente exato. Pôr tudo a perder é tipo o meu super poder, ainda mais agora que estou totalmente envolvido nas conquistas homeopáticas de um coração que vai sendo levado gradativamente. Estou me apaixonando mais uma vez, mas dessa vez sem essas delongas do amor romântico que me trazem intenso aborrecimento. Isso é bom, é a pessoa certa. Mas estou condenado a errar, tenho uma tara pela canalhice, pelo amor indigno, pelo duvidoso.
Mas eu me esforço para andar na linha, não foi a toa que eu recusei um programa lucrativo, um ménage à trois e uma subversão regada a olhos de shiva... Enfim, tudo isso para no final do dia eu trair a memória de um romance com uma vadia penada.
No começo da noite punk rock e riachão, eu chafurdado na lama e bem ao lado da barricada, fiquei pesquisando na minha cabeça de carneiro como vomitar o meu almoço sem que ninguém percebesse. Penso seriamente em virar ante - isso e ante - aquilo, tento me enturmar, mas confesso que não tenho talento exatamente nisso.
Uma criatura no ensaio punk se dizia cheio de invejinha por estar ao lado de três epilépticos undergrounds, (que droga, ele não tinha!) queria saber como era. Confirmou feliz a sua tese babaca que a maioria dos epilépticos são roqueiros, adoram anime e jogam joguinhos do tipo tíbia. Dos três infelizes eu era o menos desgraçado,por não gostar de nenhuma dessas idiotices, exceto por achar Krepax gênio. E também porque eu era o unico que podia beber aos montes, e eles não.
Como se não bastasse tanto infortunio, me vangloriei gabando que um curandeiro me curou, e consegui extrair invejinhas de suas véias. Ele queria saber como era, e eu disse que era como ter um capeta atroz no controle do corpo o torturando todo tempo, fazendo-o virar os olhos e babar feito um bêbedo inveterado. Quando eu voltava a mim era como se minha alma tivesse escapado por uma dessas brechas da exorcisação, como se a alama sustenta-se meu corpo, e não os músculos, como se diz.
E ele: "Uau!"
Em suma: a tarde foi boa, o som foi bom. Como é aquela história mesmo? "Faça você mesmo, faça a coisa certa. Junte duas caixas e faça uma festa!"
Reah!

*****

No final da noite ainda tive que reunir todas as forças para não ter uma recaída. Ouvir essa de um desafeto amoroso, uma mulher bonita, estúpida e cruel (do tipo que me cai o queixo)

"Você sabe que eu gosto de você, malgré de algumas agonias nossas que estão no passado. Dom? Está me ouvindo? Então olha pra mim. Porque me abraçou com dois mediocres tapinhas nas costas?"

"E o que você queria depois de tudo que você fez, varicela? Uma lambidela no pescoço? Se bem que um abraço de urso seria um achado."

"Deixe o cinismo para uma outra ocasião. Vamos conversar..."

"Está bem, eu vou ser bem claro com você. É a primeira vez que você falou uma coisa honesta e com nexo. As agonias realmente ficaram para trás, e te levaram junto com elas. Você está no meu passado mais longiquos, junto com as agonias."

É claro que uma boa noite sexo seria como mil frissons pelo corpo, mas eu sabia aonde ela queria me levar. Ela me levaria ao céu com a unica e absoluta intenção da queda ser ainda maior no dia seguinte.
Conheço esse veneno. Ela é do tipo da mulher devoradora de homens, essa mulher é uma ressaca odiosa, sair com ela é não querer acordar no outro dia.
Vingado.

Um comentário:

Guilherme N. M. Muzulon disse...

Louquíssimo. Louquíssimo. Lance a luz, bravo.

Eu ainda vou àquele tal encontro secrete das noites desconhecidas onde baixam os dançantes espíritos nessa bahia maluca

é isso ae..