quinta-feira, 28 de junho de 2007

Made in China


Da sacada da casa do mágico de Oz, no telhado do portão, eu encontrei um resistente robô cinza, havia anos que aquelas coisas estavam lá no telhado. Eu sou historiador e eu o achei, numa expedição que fiz em uma das minhas viagens, meses de chuva, meses de sol, uma pitada de limão.
Os olhos do robô eram enferrujados. Olhos de ferrugem, era o que mais bonito tinha nele, e o que mais se destacava, tudo que é bonito se destaca?
Acho que de uma certa forma.
O amor precisa de oleos e bacons, falar pouco e sentir mais. Gasta.
Eu resgatei o robô com minha vassoura, coisas se quebravam na minha cabeça, nesse mesmo momento alguem morre, alguem trepa, alguem reclama, alguem vive, alguem ora, alguem arma um maléfico plano, alguem bebe, alguem escreve, alguem fala mentiras, alguem escuta verdades. As pessoas fazem tudo ao mesmo tempo agora!
Coisas da humanidade...
Meu coração ta no telhado, ele tem, o que eu eu chamo de, olhos brancos. As paixões tem cor de caqui e gosto de uva. Meu coração tem mãos e luvas, braços de canudo, meu coração não tem boca, fala com os olhos, é estragado. Meu coração só tem uma perna, as paixões andam com dificuldade.
Ele veio made in China, mas tem olhos abertos, por mode ter sido pintado por alguem assim. Meu coração é defeituoso. O meu coração não é grande como o de minha mãe, é porque ainda não tenho filhos e não guardo rancores. Tem sapatos e meias, maio, junho estamos juntos. Meu coração cabe na palma de uma mão, não tem juízo, está quebrada a cabeça. Tem um pau enrrabado no meu coração.
De coração para coração, coisa honrrosa e ousada.
Meu coração veio da fábrica podre, eu dei o meu coração para o homem do lixo, e ele jogou na lata do lixo do zodíaco.
As coisas vão ficando turvas para os signos do final. Capricórnio, aquário e peixes.
Sou porra-louca mas tenho a paciencia de Capricórnio. Meu coração tem as mãos abertas, coisas de Emanuel...
Meu coração foi pro telhado, é aleijado e parece que está sempre feliz, meu coração está sempre valsando, mas não é pra mim. É pra vida passar mais depressa, ou se cansar.
Já viram uma vida sentada?
O meu coração, é a procura do homem de lata ou do resistente robô de plástico?
(Escute o Amor é feio. Dos Tribalistas.)

Socorro.

Ela era tão intensa, que mesmo calada, a presença dela completava uma casa, ela era fabulosa, humor sagaz, amor fugaz, não apreciava sagas. Gostava de estórias curtas e auto-suficientes.
Ela era tão forte, tão intensa, que descrevo a força muda dela como um despacho de macumba numa esquina, numa mera esquina, numa esquina relis, numa relis esquina, locupletava tudo e todos. Esse tipo de amor estraga.
Ela amava o cara bacana chamado Leonardo, Leonardo não era intenso, não vale apena dizer que, Leonardo não era tão intenso quanto ela, não, Leonardo não era intenso.
Pelo contrário, ele era sossegado, dono de uma pousado no coração de São Paulo, e outra no interior de Minas Geraes. Mas o verdadeiro pouso de Leonardo está nos ombros de Socorro dos Prazeres. Mulher lasciva, tão pura e honesta como uma pré-rafaelita, como se não bastasse carregar nos ombros o marido, carregava também o nome perfeito para ser mártir. Cheio, como tudo que ela pensa.
Ele encontra nela o equilibrio e vice-versa, é um casal, normal desses tantos que se exibem por aí em festas cheios de cicutas pelos cantos, burgueses, depultados, madames, marinhas e madonnas.
Ela enchia uma festa, ela inundava olhos, ela movia os rostos na direção que passava, as mulheres morriam, os homens amavam, e ela nem aí, maravilhosa no seu vestido rosa, sincera com a sua sensibilidade.
É aquela velha estória: O mais forte pisa no mais fraco, e o mais fraco pisa no mais fraco que ele. Era assim porque era desse jeito.
Socorro não era feliz, apesar de ser bela, Que comparação tola essa, que ideia a minha. Que se foda a beleza! Socorro não a suportava.
Tinha dias que o Leonardo não aguentava tanta intensidade, ela era como o sol, um astro rei, que por ser astro ganhou o cargo de também ser dia. E como toda glória vem embalada em danação, segundo os deuses invejosos que apreciam grandes quedas. Era assim com Socorro dos Prazeres.
Ninguem conseguia encará-la por muito tempo, a presença dela queimava as pessoas, quando não cegava.
Leonardo era uma estrelhinha calma e brilhante no meio de tantas outras. Socorro lembra, numa mesa de bar na rua da Gávea, numa rodada de shopp e amigos, todos sorrisonhos, esbanjando etilismo barato. ela comenta que o Leonardo quando brigava com ela, quando os dois discutiam por alguma razão, ele via nela a Medeia.
Seria realmente a verdadeira imagem de Socorro?
Leonardo sorri sem graça e escapoli no banheiro. Mais tarde, no quarto, ele diz que não gostou do comentário, que era algo particular, desculpinhas e beijos.

Socorro... Socorro... Sem sono, nem bocejo, Leonardo repetia o nome da amada como numa prece.
Socorro dos Prazeres é um nome tão agressivo.
Na verdade é um paradoxo.
É um pedido de socorro, quase uma súplica.
É um desespero. Um grito de Van Gogh.
Prazeres me lembra fruta cítrica e banho quente.
Fruta e cachoeira, banho quente me lembra tristeza.
Socorro é um nome pobre.
Dos Prazeres equilibra, me faz virar santa nordestina.
É verdade... Não havia pensado nisso.
Boa noite.
O sono havia chegado para Socorro numa carruagem diferente, mas Leonardo não tinha sono, nem asas, dormia quando tentava, todo encolhido na cama de casal do lado da esposa, encolhia-se com medo de acordá-la, com medo de tocá-la e acabar libertando volupias indesejáveis, tão agora, aprisionada em mente. Leonardo pensa que deva existir no mínimo dez pessoas intensas em cada país. Socorro era uma delas, ela enchia uma cama, fazendo-o dormir no canto da cama,quando senão no sofá da sala, com a desculpa esfarrapada de que estava assistindo tv.
Leonardo tem uma amante, e eu não o condeno, porque ele e a história precisava de uma válvula de escape, para seguir, como num autorama em que ninguem sangra, eu criei uma amante para ele, Leonardo fode com a burrice todos os sábados, no fim dos dias uteis.
O fraco pisa no mais fraco que ele. Voltava pra casa vitorioso, beijava a mulher que usava um conjunto de vitoriana, tomava café sentindo o prazer nos lábios de ter o corpo e o cheiro de outra no seu corpo, sentia o escroto prazer de dividir esse cheiro feminino com a esposa, na hora do sexo como na hora do almoço. Sentia-se vitorioso por saber que a enganava, por saber que a traía, sentia-se estupidamente grande!

Mas o que ele não sabia era que Socorro também sabia, ele não sabe que eu tenho cartas na manga, que eu jogo sempre dos dois lados. Ele pensa que eu sou seu amigo. Aceite a verdade de que todo mundo é um pouco falso!
Ninguem fala tudo o que pensa, nem eu, que falo pouco, por problemas de que quando eu falo demais o interior do meu nariz seca e a palma da minha mão formiga. Por isso também escrevo, mas nem sempre escrevo tudo o que penso, tenho que largar mão da poesia.
Mas a culpa não é toda minha, nem fui eu que contei sobre a traição, é que antes de escrever que Socorro sabia que era uma mulher traída, ela já era uma mulher, e eu a criei intensa, com um fluxo violento de menstruação, como a de todas as mulheres fortes. Socorro era uma das dez.
Ela respeita sutilezas e aprecia nuances, ela descobriu por sí só, ela descobriu, talvez, sei lá, por causa de um bobo olhar trocado numa festa.

Seus olhos estão molhados.
Deve ser porque eu estou chorando por dentro.
Que bonito isso. Mas não, acho que é só sono mesmo.
É. Pode ser...
É. É isso.
É uma estória de um tipo inapreciável de amor que estraga.
Gim e Rum.

Devaneio n° 01

Olha, eu sempre volto atrás, eu sempre altero as coisa, risco outras, não gosto de me ler em voz alta, como num recital boêmio. Gosto de falar sobre mim bem baixinho, com olhos de drãgão, já peguei o macete, agora é só fluir...
Com o tempo leitores, caros e baratos amigos, vejam bem, com o tempo vocês vão me ler sem tropeçar.
"Me ler", frase solta né? Tudo é costume, até quem sai da depressão sente saudade dela.
Eu tenho medo da intensidade, do pouco sucesso que tenho, do muito que terei, assim espero. é o que todo mundo que escreve almeja! ganhar dinheiro com o que escreve.
Um dia, será cool gostar de mim, tomar no cool ninguem quer.
Mas em relação ao sucesso, tenho medo de ficar soberbo, ressalte em suas memórias que há crueldade em todo ser humano. Eu mesmo, as vezes gosto de cuspir na cabeça das pessoas.
Desconhecidos me chamam de gênio, dizem que sou seu escritor predileto, desconhecidos choram comigo, eu que não tenho nem postura, terei que inventar uma?
Ah não, nem quero, sou preguiçoso demais para fingir.
Prefiro guardar a lisonja, e convidá-los para tomar um shopp comigo.
Tenho medo da soberba, o mesmo tanto que Deivide tem do "achismo". Eu tenho medo de parecer falso.
E o que é o poeta então? Mas não é não, na verdade, quando tudo um dia fizer efeito, tambores rufando em meu peito, confetes e serpentinas em meu cabelo, auditórios e palmas para Dom Quixote, que ele merece! Luzes artificiais, maquinas fotograficas que trancafia as pessoas num só gesto. E puf!
O que eu vou querer depois?
Antes, quando eu mal escrevia, ou quando escrevia mal, não pensava em lucrar com as minhas desgraças, a quem interessaria? Estou cheio das sagas, de estórias longas, as pessoas gostam de grandes estórias...
Serei um guardador de contos! Ser poeta é tentar ser um pouco falso, não dá para se esconder atrás da poesia, é você ali, é você ali na prateleira da livraria.
Alguns textos meus valem o preço de uma pinga, ou de uma carteira de cigarro_Deivide que o diga_ mas não liguei tanto para isso, aquele texto que ele vendeu valia dois reais mesmo, tava bem xôxo.
Ele precisava beber, e eu queria fumar.
O foda foi ler para o pulha, que por sinal, era prefeito da cidade. ou algo do meio politico...
Um dia, talvez, eu seja um mediocre. Vou deixar de escrever para mim, e vou escrever as coisas que as pessoas gostariam de ler.
Um dia, talvez, eu não seja nada. Leia em voz alta esse texto e me chame de tolo sonhador.
Um dia, talvez, estarei sozinho, mas com cada ex-amigo meu guardando uma edição ilegal do meu livro legal nas profundezas da gavetas.
Um dia, talvez o dia não chegue.
Talvez nada aconteça. ou talvez, tudo.
E Viva as hipóteses!
Olha, tenho um poema bonito que fiz na página de ontem, numa manhã manteiga. Eu gosto tanto dele que logo irei enjoar.
Como as coisas que eu amo.

O Sonho.

16. O ser humano é dotado de força infantil.
Ô flor, vou te contar a bateria de sonhos inexplicáveis que eu tive. Tu escuta, mesmo sendo eles inexplicáveis?
Ô flor, eu estava bêbado, não teria como sonhar com cisnes.
Mas eu sonhei. Eu sempre sonho muito quando durmo no chão.
Ei. você ainda está aí?
Pois escute enquanto ainda há tempo, na verdade, estou te enrrolando... É. você sabe.
Eram momentos que ainda irão passar. Eu sonhei com o amanhã, não futuramente bom, no caso, o hoje mais ou menos.
Nada do que eu sonhei se realizou.
Tudo bem pra você?
Tomei vários sustos, tomei vários tapas, me embriaguei de água potável, quebrei copos, invadi geladeiras, roubei cigarros e fui dormir.
O sonho era um filme psicodélico, eu era uma super-8.
Sonhei com o hoje e acordei com o hálito amargo do ontem torpe, ressaca moral é uma das piores ressacas. O vento nessas bandas de cá produz musica, seria bonito se eu ficasse mais tempo, mas as bandas de cá não é minha, o vento das bandas de cá não me pertence. Só o sonho, só o sonho é minha pantera.
Ô flor, o sonho acabou. E eu te acho meio pálida, você me diz que não tem se alimentado direito, eu também.
Aproveite o tempo minha flor, enquanto há.
Vai pra rua, porque vai chuver.

Tire uma foto para a eternidade

Ser bêbado não é fácil. Você faz um esforço filadaputa para lembrar do ontem, e só consegue descobri curtas, flashs, ensaios e assaltos remotos.
Coisa pouca, porém, bobagem é pior.
E quando se recorda, ou lembra, ou sei lá. Tudo a mesma coisa. a unica coisa que fica é aquela sensação na boca de ter preferido nunca ter lembrado.
É o que eu chamo de amnésia etílica.
Ele tem o meu ridiculo digital em uma 3/4. Ele quer dizer num futuro utopico e bom:
Comi o Paulo Coelho!
Não!
Comi o Nelson Rodrigues!
Bem melhor...
Não me importo. Eu sou o ridiculo. Querem ver? É só me visitarem, e me trazerem orquídeas peruanas. Não, não, não servem as paraguaias. Só peruanas, aquelas que vai de boca remetente a nariz.
Verás o meu ridiculo sem precisar de fotografias.
Eu não sou tão esnobe assim, não existe mascaras do tamanho da minha cara, nem sob encomenda. Não existe e ponto final...
Exiba. Mostre. Ganhe algum dinheiro com as suas ousadias e um pouco de atenção.
Não passará disso.
Eu me renovo a cada página que passo com os dedos salivados, não admito orelhas, nem dobras.
Eu sou do tipo de pessoa que nasceu para ser eterno em algum lugar.
Na memória, ou na lata do lixo.
Eu me renovo sozinho e como as borboletas.

O homem que tocava flauta


Numa certa noite, eu tive um sonho. Um homem que tocava flauta me encontrou, e me contou um sonho que teve, era um sonho dentro de outro sonhos, dessas coisas que só acontecem em fábulas, ou em mentes imaginárias.
O homem que tocava flauta cheirava benzina_drogas de punhetinha_ e no sonho dele, havia uma prancha, dessas de surf, mas não havia mar.
Um sofista estava em cima da prancha, mas ele não era surfista.
O homem que tocava flauta me contou que ela girava e o sofista girava junto e exalava flores lisérgicas e cores de ácido sulfurico.
O homem que tocava flauta era velho, mas no sonho ele era um garoto, seus olhos brilhavam com o brinquedo novo, como se descobrisse um novo mundo, uma civilização desconhecida. Ele queria ser, ele queria estar, ele queria sentir.
O poder do olhar chamou a atenção do sofista, o sofista disse:
"Quer brincar?"
O homem que tocava flauta respondeu com os olhos lascados de criança.
O sofista saiu, e o homem assumiu o centro.
"Pode brincar, porque vai ser para sempre."
Hoje, até a eternidade, e até o fim dos tempos, o homem que tocava flauta está no centro, e logo agora que ele descobriu que esse brinquedo é cansativo.
Eu acordei.
Mas o homem que tocava flauta ainda está lá.

Os bons da cabeça.


Quase sempre, tambem somente quando leio coisas boas_ em atitude particular_ como o livro da Fernanda Young, eu me sinto fodidamente abalado, todavia quando consigo encerrar um capitulo, porque paro de ler e dou pulos de alegrias. Como a escritora Ma Satya Bharti fazia ao ler o primeiro livro do Rajneesh. Ela dançava e dizia: "Sim! Obrigada! Mil vezes obrigada!"
Não que eu dance, não é pra tanto, nem sei dançar. Só gostaria muito de ter escrito aquilo que leio com fome de leitura, invejo a capacidade das pessoas de escrever bem, de criar estórias... eu sou tão disperso bicho...
Mas ainda quero parir um livro, tão gostoso e vivo quanto esse que leio.
"As pessoas dos livros"
Eu sou um ser invejoso, isso me destrói, destrói a força lacônica e oculta que me empurra para o limiar de um romance, de escrever um romance. Será mesmo que eu quero um romance?
Não. Que seja um livro! Quero um livro meu, e é como se gritasse: "Eu quero um filho!"
Até estou escrevendo um, com um amigo que eu ainda não conheço, mas que hoje mora em Portugal. Acredito pra caralho nesse livro. e eu sei que eu estou adiando de tocá-lo, pois ele, dessa vez está nas minhas mãos, sob minha custódia. Preciso me organizar, publicar a enxurrada de textos novos nos blogues, e quando as casas estiverem arrumadas e tudo estiver limpo, à noite, comprarei cigarros, e fumarei três de uma só vez, aproveitando o frio, conversarei com alguem, ou talvez, quando chegar a vez, queira ficar sozinho, com a boca amarga e um drink, quem sabe uma água ardente de cana envelhecida.
Continuarei o livro com a lucidez que Deus me deu, mas tenho que tratar de algo psicodélico... Não posso me dar ao luxo de ficar a mercê das inspirações e dos beck´s que me relaxam. Tenho pressa.
Quero domar minha escrita, vai ser uma vitoria pra mim.
Até comecei um romance policial, o Banho Maria é interessante, mas bastante genuíno, com diálogos extensos como numa peça teatral. Era um romance cinematografico ou um livro teatral, algo assim perto disso, mas no entanto, bem mais ou menos. Comecei esse livro com 14 para 15 anos de idade, era um peça teatral para a escola. Conhecia pouco dos muitos escritores que hoje conheço! E os que ainda estou para conhecer!
Não estava preparado, hoje não sei se estou preparado para escrever um livro, sim, já estou escrevendo um. Mas tem o Guilherme segurando as pontas.
Prometo me dedicar.
Quanto ao Banho Maria, que me dediquei e depois abdiquei na página... trinta e oito? por aí... Não sei se volto com ele, é um romance cheio de supense, mas não sei se o quero mais.
Empacar é uma merda.
Uma mulher grávida na avenida Central grita: "Alguem pode me dar um tiro na barriga?"
Talvez eu o rescreva, talvez eu o jogue fora, mas é bem mais provável eu retalha-los em pedaços, até reduzirem a contos que me lucrem elogios.
Eu sou um lerdo que tem vontade de falar, começo sempre com uma coisa e termino com outra, é como um distraído, ou como um esquizofrênico que não é hábil o bastante para acertar o caminho de casa, por isso estou sempre voltando para o começo, para tudo ter um fim, um fim imediato nos meus textos.
Quando eu leio coisas boas, eu me sinto inssonso, vazio, é a inveja.
Eu preciso acreditar em mim para afogar minha inveja. Me destroi porque me desmotiva, não me acho bom o bastante, me parece que eu não tenho mais nada para dizer, é como se tudo que eu sinto já fosse ditos pelos assassinos.
Dos que me mataram, ou me cuspiram, ou me injetaram doses cavalares de melancolia:
Aldols Huxley. Dostoievski, Nelson Rodrigues, Hilda Hilst, Clarice Lispector, Drummond, Florbela Espanca e outros tantos que não me recordo, porque quem já apanhou de muitos só lembra de alguns.
O que eu sei é a unica coisa que acho que realmente sei.
O que me destroi é o bastante para me motivar a escrever.

quarta-feira, 6 de junho de 2007

Netinho.

Netinho. Filho do meu filho João.
Arnaldo neto. Netinho.
O meu netinho.
Menino buliçoso, filho de pai belicoso.
A mãe tem bulimia.
Eu tinha uma Cannon. E ele me via.

-Da pra ver o mundo vô?
-O mundo é vasto e grande menino!
-Grande, como o tio Gabo?
-Mais rechonchudo.
-Gorda como a tia Velha?
-Hum... Um pouco mais.
-Mas com i, ou, mas sem i?
-Como?
-Porque se for, mas com i, é grande e vasto, como o tio Gabo. Agora se for, mas sem i, é gorda e palpiteira como a tia Velha.
-Entendo... Você ta muito esperto menino. Muito esperto para a sua idade.
-O senhor também vô, é muito esperto para a sua idade.
-Hahahahaha... Mas seu moleque danado...
-Mas é, mas com i, ou, mas sem i?
-Mais. Com i.
-Mas seu moleque danado, foi o com i, ou sem i?
-Sem o i.
-Entendo... Sabe vô, eu não queria crescer, queria ser para sempre criança.
-Não? E por que não?
-Vocês, gente grande se acham grande demais.
-Grande, como o tio Gabo?
-Um pouco maior.
-...
-Não tem uma forma que me faça ser para sempre criança?
-Tem sim. E ela está dentro de você, é só procurar que você encontra... É um pouco complicado de achar, mas com o crescimento você encontrará.
-Tira uma foto minha vô!
-Claro! Humm... Vai ali, senta ali perto daquele muro, põe as mãozinhas no rosto, assim... E faz uma cara de... Uma cara de triste!
-...
-Não, não, não é para me dar língua! E nem fazer careta! É triste menino.
-...
-Hahahahaha. Aí você ta enfezado, que carinha feia! Conheço essa cara. É igualzinha a cara que você faz quando eu te mando tomar banho.
-...
-Tapando o rosto com as mãos? Que novidade é essa menino? Hahahaha.
-...
-Sorrindo? Mas eu falei um rostinho de menino triste.
-É que eu não sei como é ser triste.
-Ah... Meu deus é verdade... Esqueci, esqueci que você é uma criança.
-Tchau vô! Vou brincar!

Saiu espalhafatoso atrás da pipa e me deixou sem sabor.


Um retrato de corpo inteiro de Rick Van Pelt ou Entrevista trovoada.

Era uma tarde de domingo e eu havia passado na casa de Rick para tirarmos fotografias no Sumaúma. Essa entrevista não foi premeditada. Eu lia pra ele a entrevista de Pablo Neruda feita por Clarice Lispector, e meio assim, meio ao acaso, comecei a lhe fazer perguntas, e a partir das respostas, achei que daria um bom texto. Porque é meu dom captar poesia na boca das pessoas.

Rick é do tipo de pessoa que sussurra quando fala e quando escreve, é dono de uma sutileza incrível, e um olhar mágico. Rick que eu não imagino falando um "Vá tomar no Cu" intenso, Rick que fala palavrão escondido, Rick que ama escondido, Rick que também ama a luz do sol, Rick que se atira, Rick que se joga, Rick de visão, Rick cego, Rick no escuro, Rick sem graça, Rick areia e pó.

Eis o homem!

-O que tu escreve te agrada?

-Agrada sempre porque nunca está pronto.

-Tu se considera um poeta?

Ele parou em pausa, abaixou a cabeça e comentou: Pôxa, você me pegou. Ele foi falando como que se não tivesse a certeza de nada, como que se tivesse aprendendo a andar, ou a falar.

-Não... aliás... sou tão poeta quanto fotógrafo, quanto desenhista, quanto qualquer coisa. Nada me impede de fazê-lo.

-O que te impede? É uma pergunta sem mais porquês, porque é para ser assim.

-Eu estava mesmo esperando o resto.

Rick se consulta em segredo todo tempo, e eu o observo pelo buraco da fechadura, e ele parece ser tão bonito visto pela fechadura da casa.

-A falta da quarta dimensão. Ou então (você poderia escrever assim) não tem nada que eu queira fazer de verdade.

-E o que você quer fazer Rick?

-Isso tá na entrevista?

-Sim.

-Nada. (Logo após de uma escapulida de sopro profundo). Por isso que é bom não pensar muito. Vontade sempre acaba com gosto de obrigação; se você parar para pensar, ninguém quer fazer nada. É como um gato miando; você dá leite, comida, carinho, mas só sabe que ele ta miando.

-O que é angústia?

-O que é angustia...? Existem boas metáforas pra isso...

-Não quero metáforas, quero a sua resposta nua, como a angústia.

-Acho que é... A gota que vai fazer o copo transbordar.

-Isso não é uma metáfora?

- Na verdade, a minha resposta é: existem boas metáforas pra isso.

Conversamos um pouco, eu contei pra ele algumas histórias de olhos caídos e sensações, sensações minhas que viraram contos, citei um texto do Guilherme Muzulon que fala da gota que transborda o copo d´agua, e disse pra ele que eu gostaria de explodir em catarse. Como no texto abaixo:

"E eu e todo o mundo deveríamos ser

Como água

Que jogada no copo

Sobe, sobe, sobe, sobe até as alturas

Sempre achando a liberdade

E que derramada no chão

Vai se espalhando profusa no vácuo..."

Rick estava com sono e nós dois estavámos com fome, mas ainda sorria entre um bocejo e outro. Prolongamos nossa conversa e acabamos por falar de coisas completamente diferentes, ele me alertou.

-Talvez sejam apenas pontos de vista. Voltemos para a entrevista, antes de nos perdermos um do outro por caminhos turvos.

-O que você entende por se sentir, Rafa?

Agora é minha vez de consultar meu silêncio.

-Ontem à noite, a minha ex-namorada me contava dos seus amores e tragédias. Ela me falou que um dos seus amores, talvez o mais verdadeiro, era como eu. Ele quando fazia o que não tinha vontade, gritava: Arrudiai-vos o mundo!

-Cinthia disse isso?

-Disse. E eu me senti cansado no momento... talvez eu tenha entendido de outra forma o que ela quis me dizer, não sei.

-Eu entendi da mesma forma que você. O que eu entendo por me sentir, é como uma crise de esquizofrênia, é como que se eu entrasse em contato com cada parte do meu corpo, é como que se todos os meus sentidos se aguçacem, e essa é uma sensação terrivel.

-Terrivel?

-É estar muito conectado à carne, e a este mundo.

-Não seria o contrário?

-Não. Não seria.

-Eu acho que eu nunca me senti de verdade... (Olhar perdido no céu...)

-Talvez sim. Do seu modo. (Ponho flores em sua boca.)

-Você pretende escrever um livro?

-Pretendia. Hoje em dia, não sei.

-Por quê?

-Sou preguiçoso, egoísta e indisciplinado.

Eu pergunto a ele porqê ele escreve, ele me diz que essa é uma pergunta indiscreta, eu pergunto por quê. Ele me diz que é como uma mania singular, e uma criança curiosa pergunta com uma inocência cruel o porquê do toc ou mania, deixando as pessoas desconcertadas.

-Eu sou uma criança curiosa.

-É, eu sei. E cruel.

Uma certa moça sempre engole a mão quando acaba de falar. Seria tenso se você olhasse para os olhos dela, e perguntasse porque ela engole a mão quando fala. Seria engraçado, Rick, até seria... Ele me responde a pergunta, com uma meia verdade.

-Escrevo para tudo o que eu penso se tornar mais palpável.

Depois de alguns instantes, ele me responde com uma verdade inteira. "Escrevo para eu ler depois”. Eu apenas concordo.

-Quem é Deus?

-Eu não acho que Deus seja.

Há algumas respostas que não podem ser tocadas, e nunca foi meu hobby dar pérolas aos porcos.

-Como você descreve um ser humano mais completo possivel?

-Eu não acho que precise de muito para ser humano; ser humano não qualifica qualidade. Errar é humano? Consertar também é.

-E onde está o completo nisso tudo?

-Esta no gelo espiritual, na inécia não quebrada, no universo isolado, se isolado, lembra?

-Lembro. Como é uma mulher bonita para os seus olhos?

-Acho que seria... (Ele se enrrola nas imagens sem legendas) Uma mulher cuja beleza tocasse, ou toque, minha beleza interior.

Ah, porque uma hora dessas ele não é um passarinho?

-E essa linda mulher existe?

-Existem.

-Você faz poema sob encomenda Rique? Eu não consigo fazer.

-Eu já fiz. Não me peça!

-O papel é todo seu, escolha as palavras mais verdadeiras e faça o seu poema.

Não.

Amarga menos se comido cru, logo pela manhã.

-Escrever melhora a angustia de viver?

-Quem disse isso?

-Você concorda com quem disse? Perceba que eu tirei a interrogação e afirmei o que não é meu.

-Acho bem verdadeiro. Isso não basta?

-Sim.

-Ou... considero aplicável. Mas quem disse isso?

-Faço minhas as perguntas da Clarice Lispector, eu a afirmo. Acho que escrever melhora a angustia de viver. Pelo menos pra mim.

-Então. É aplicável... Você é amigo dos seus vizinhos, Rafa?

-Sim. De alguns.

-É de andar na casa deles?

-Não.

-Eu já fui. Até isso minha mãe tirou de mim, ela me afasta de todos os meus amigos, porque ela é medrosa. - inveja as botas do homem que passa - Ela prefere um vegetal vivo a um animal morto. Eu queria dizer isso pra você.

-Eu tenho dito Rique. Há muito que sei sobre você e não consigo falar, sou embaraçado nas palavras, como você. Qual foi a maior alegria que teve pelo fato de escrever?

-Acho que a alegria de "fazer você mesmo", sem o kit "Faça Você Mesmo".

-Como procede a criação de escrever, para você? Rola inspiração, ou flui como um rio correndo para o mar? Porque comigo é assim.

-Eu sou o iceberg esperando o aquecimento global; enquanto isso, vou suando em dias quentes.

-O que você quer dizer?

-Eu acho que já tenho tudo pronto dentro de mim, e vou soltando através de estímulos, como pipas, mas por enquanto está tudo congelado... ainda não veio aquela onda de calor lancinante.

-O que você tem para dar?

-Não tenho nada para dar, eu só tenho.

-Diga alguma coisa que me surpreenda.

-Alguma coisa que me surpreenda...

Rick é tão vago que eu achei que ele estava pensando na resposta, mas eu estava vindo com o cajú e ele já comia as castanhas. Ele me repetiu, não foi algo que me surpreendeu, faltou atenção da minha parte. Mas entrei em estado de graça.

-Você é verde-escuro, Rafa.

-Eu? Por quê?

-Porque sim. Que cor eu sou?

-Você não tem cor. De qual poema seu você mais gosta?

-No momento?

-Sim.

-Não sei, até ontem eu gostava de "Domingo de sol e chuva", talvez por causa do ultimo verso. "Ah! Quero devorar sonhos!"

-O que você deseja para você?

-Posso ser terrivelmente medíocre e honesto na minha resposta?

-Pode.

-Dinheiro. Dinheiro muito. Não é isso que move o mundo, Rafa?

-Não sei Rique, eu às vezes duvido, mas acredito que seja só um empurrão. O que é amor?

-Amar é querer bem.

-Como sua mãe lhe quer?

-Sim. Também. "Bem" é uma coisa muito pessoal. Amar é querer bem e só, sabe? Apartir do "querer bem" você entende o que é certo. É comer...

-Você fala isso porque sente fome?

-Outro dia, uma gata teve três filhotes, e devorou dois; por quê? Seria pelo fato de que foram corrompidos em sua essência? Se fosse pelo modo de estranhar, ele devoraria qualquer gato. Entendi tudo como um impulso animal de devolve-los às suas entranhas, para que lá reencontrassem sua essência.

Um silêncio enquanto escrevo. Ele me pergunta:

-Você está escrevendo isso tudo?

-Sim.

-Nossa! Só assim para ter algo meu escrito em cinco folhas!

-Não estou escrevendo bobagens. Você já sofreu muito por amor?

-Muito? Não.

-Você já sofreu por amor?

-Amor romântico já. Acho que o amor romântico é a única coisa que faz a gente viver sem pensar. É um amor idiota, porque é mal explicado. E você, Rafa? Já sofreu por amor?

Silêncio profundo. Os meus olhos caem.

-Você está quieto porque está pensando? Porque não sabe? Ou porque ainda vai me responder com qualquer coisa?

-As três alternativas.

-Eu sempre tive vontade de te perguntar.

-Não sei se sofro de amor, talvez eu sofra por falta de amor romântico, talvez eu sofra por quem me ama e não é correspondido à altura. Eu odeio quem chora por mim; não me acho bom o bastante para ninguem sofrer por mim. E nem gosto dos amores unilaterais, não tenho tempo. Eu tentei Belas Artes e perdi no teste de aptidão. Rique, porque você existe?

-Eu não sei porque Ricardo está aqui.

-Eu talvez saiba.

-Por quê?

-Para me ajudar, de uma certa forma, pois sou uma colcha de retalhos. Para dar sentindo a esse momento. É isso. E nem sei se é só.

-Eu gostaria de tirar melecas do teu nariz, mas sei que eu não posso!

Rimos!

-Rick. Quer me definir em palavras?

-Não. Estou perto demais.

Enfim. Ele me contou um segredo.

Uma carta para God-boy.


A verdade toda era que de perto, erámos leves idiotas! Idiotas por sermos mal explicados, idiotas por querermos dançar ciranda na lama escura.
Idiotas por falar o que pensamos um para o outro naquela noite até mais ver, foi tudo tão grotesco e tudo aconteceu tão rapido. O nigeriano ilegal, o sol, a pedra, meus impulsos, suas razões. Discutimos se Bentinho era corno ou não, lembra?
E nem entramos num acordo... E quando entramos?
Eu já perdi algumas folhas e um pouco do meu tempo, no final de tudo, a melancolia toma conta, e quando a tristeza abraça, quebra os ossos. É preciso sempre renovar o estoque.
Eu trabalho num almoxerifado de uma loja, onde tenho que usar um chapéu babaca e dizer bom dia para todo santo dia.
E você ainda desenha um destino triste pra mim...
Me dê um real, estou com fome e vou comprar uma promoção. A lagrima estacionada nos meus olhos ontem a noite, não surgiu de você, tenha dó! poupe suas explicações, eu sou um homem prático e só choro por mim mesmo, e também choro pelo menino que queria ser herói e perdeu no teste de aptidão.
Tudo derrepente declinou para o enfadonho, o sol noturno já havia ido embora, e eu até riria do meu alter ego se estivesse em outra posição.
Afaguei um cão na rua, e hoje ele me quer para toda vida. As saias com o tempo vão ficando justas, e a mamãe diz que eu tô crescendo, saber demais é sempre muito perigoso. Ô se é.
Rebocado do bar (parte dois)
Fui atropelado (parte três)
Dormir mal (parte quatro.) Quatro dias on the road na cidade do Vaticano.
Sabe o que é dividir uma cama de solteiro god-boy?
Sabe o que é disputar cobertor?
Sabe o que é sentir seu estômago nas costas, e as costas numa parede fria?
E o homem bêbado pegou o pano que se seria nosso acalento e dormiu no chão, como um cão. Eu fiquei por cima dos corpos, como um abutre. Eu tive uma sensação terrivel.
Achei que eu iria morrer de frio. Não como a simplicidade da frase "estou morrendo de fome" estou morrendo de frio" ditas por burgueses na rua das Horas.
Achei mesmo que iria morrer de frio, e não podia fazer nada, o meu joelho já batia na testa, e eu era de fato, um feto sem últero naquele momento.
Saber que vai morrer e não poder fazer nada deve ser algo terrivel.
Enquanto isso, no que chamam de chão, o homem bêbado gofa pequenas doses de morte e melancolia.

Pois Zé.


1989Guilherme diz:
pois.
Dom. diz:

1989Guilherme diz:
ruela.
Dom. diz:
na rua vê ela.
1989Guilherme diz:
ela cantarola sem avental, debaixo do sol, onde brilha a luz da casa vinda da janela.
Dom. diz:
a lua entra no swetter da noite, e tudo esfria. e a janela implora chá de camomila
.
1989Guilherme diz:
janelas pra que te quero e aí ela vibra a garganta "qual delas, qual delas, onde entrar, por onde passar?" e ela geme sob a penumbrosa noite e ela freme e muda de cor feito a um cameleão e ela treme e ela aguenta mais um pouco até que seu amigo rouco vem até seu decote lhe convidar...
Dom. diz:
quer pó com pacto? pq é nescessário gritar sem acordar o medo, e zé precisava dizer "eu te amo" com voz rouca, como se forçasse para parecer audivel, a rua teria que escutar. a rua... ela.
1989Guilherme diz:
Bip. mais um madrugada adentro/ Frescor sonolento que vem do riacho/ Veraneio ameno enrolado nos cachos dela/ e ela geme e ela treme, como se fosse a última das horas e ela freme e grita como se não tivesse mais como sair dali...
Dom. diz:
Ela não sabe gritar. Daqui, Dalí salvava a dor exposta na face dela, com aquarela carvão sob tela, tudo era de um charme tecnicollor, e ela andava levemente bêbada pela praia, como que se flutuasse...

Dona Alice no país do haxixe.


Enquanto eu tingia meu cabelo de vermelho, ele me explicou alguma coisa que entendia muito bem, mas eu não prestei atenção. Queria que soubessem, sem eu mesmo contar, o que eu penso quando as pessoas falam de fascismo e burguesia.
Ouvi dizer que ela ficou louca de tanta alegria, entre os seus livros velhos, pórem, não menos queridos, havia Proust e Stendhal.
Dividimos um pequeno lençol fino acalentando os pés, os pés acalentando os outros pés.
Amamamos um ao outro no escuro, e foi bonito como se fosse claro. Amamamos um ao outro na presença dos outros, não via-mos, tudo era apenas tato, e fomos tateando sentimentos... É como tocar num fio descascado e esperar o choque, é como provar uma deliciosa comida e esperar o sabor.
Apesar do chão frio, do desconforto e dos odores próximo ao meu corpo, dêi-me ao luxo de sonhar, sonhar com mil japoneses iguais, dormindo todos em um grande quarto, todos em corcova.
Pela manhã, acordei com a moça pisando pesado pela sala, pernas de alicate, ombros de coqueiro ao vento, bons observadores.
Olhos remelentos limpados com dedos e linguas, bocejos sem bom dia, levantar acampamento.
Fomos nos alimentar na casa de dona Alice, e pela rua, um carro de som anuncia uma morte, e pede com a voz de quem faz o seu trabalho para irmos ver o morto.
Seu Quiquito, não o conheço. Mas eu desejo que alguem o tenha.
Entramos na casa de dona Alice, e ela nos recebeu com bolos de revistas velhas e café requentado. Se queixava, a velha cheia de elefantíese, retrato fiel de Portinari.
"Fui no hospital, e o médico me recomendou esses remédios" _ Abrindo o saco e expondo inumeras cartelas de remédios caindo no chão. A velha retomou ao catar todos os antibióticos._
"O médico me disse que esses remédios era para toda vida..."
Iria para o lixo, junto com as revistas, um album de fotografias antigas, um casamento em cor cinza. Deixo explicito para vocês, porque tenho que ser verdadeiro comigo, mesmo sem barato nenhum, roubei uma fotografia pretoebranco bem tirada, não iria fazer falta para quem um dia presenciou tamanho feliz fato, suponho eu.
Do outro lado da rua, dois recem casados saiam felizes da igreja e sustentavam sorrisos para os flash´s, e engoliam arroz e feijão com irritação disfarçada.
Gabo comentou:
"Já tem mais de uma hora que a gente está aqui, e aquele casamento não acabou, eles ainda tiram fotos!"
"É para guardar numa moldura, e dizer que um dia foram felizes."
O copo descartável indo embora, vento levado, e o garoto punk me deu ontem a bebida forte e me disse que tinha gosto de ferida, acabamos por disputar a bebida doce com as moscas.
Voltemos para a dona Alice.
Ela era simpática, baixinha de cabelos brancos, parecia meio mão de vaca cansada. Vigiava o açucar consumido, porém, só tomava adoçante.
E eu pensei ao beber o café requentado:
Tudo o que é doce atrai moscas.

A morte do eu te juro.


Era uma tarde de céu azul aberto, e nuvens esparsas, é um daqueles dias que cheiram a centeio, pão misturado com vinho. Ele escrevia uma carta em que a cena (o)corre a noite, e não se sabe porque a lembrança de um sorriso veio bater-lhe a porta, hesitou em encarar a percepção, não queria pensar nela, nela que ele amava, nela que ele um dia odiou, nela que há muito tempo já se foi, nela que está gravada em fotografia, sorrindo, sempre sorrindo, um sorriso que mal cabia na boca, sorriso que feneceu no dia 06 de maio, por volta de seis meses, divago... Três meses.
Os três ultimos meses foram de alegrias serenas, mas uma alegria assustadora, como a gula daqueles que sabem que vão morrer.
A fotografia mostrava a ele, os detalhes que ele já conhecia, corpo sinuoso, pernas longas, rosto bem talhado, todo trato de ser muito simples.
Ele a odiava por não saber que a amava, a piedade trouxe a tona a verdade. O tumor subtraiu os dias dela em resultado de seis meses, ela que era quase uma criança e que hoje se encontar no limbo. O seu nome já havia sido colocado no estandarte de tempo, _desde que nasceu_ pelo deus que ela não via.
Ele atravessou o caminho dela porque ela o amava, e foram, foram sendo, porque amar é dar-se com vontade, é dar-se por inteiro, foram indo contra o relógio, e quando ela chorava, ele dizia do seu conforto, com voz mansa.
"Ei. o tempo somos nós. O dia não se renova enquanto não dormimos, eu sei que a noite quer cerrar os olhos, mas não vamos permitir, a deixaremos insône, enquanto isso, continue me amando."
E ela o amou, tão docemente, que as lágrimas secaram-se e o amor vicejou no escuro.
Mas a danação maior da estória é o vazio inexpressivo que ele sente em contato com a fotografia dela!
Perdão.
Vou ser mais atencioso. Darei palavras a fotografia e logo revelo o segredo. É a mudez da foto que o destrói, que o deixa ôco, ôco como a certeza que existe sem viver, ôco como a versão sólida da mesma coisa.
Era uma tarde de céu azul aberto e nuvens esparsas, um daqueles dias que cheiram a centeio. Pão misturado com vinho. A piscina também era azul, e ao redor, verdes e cigarras imitando ciganas, logo a noite se aproximaria, e os neons da cidade iriam imitar os vaga-lumes do campo.
Marybelle Lee se preparava para dar um salto na piscina. O fotografo meia boca estava atento, era uma polaroid e mais parecia que iria revelar Jesus Cristo.
Lee pulou, e o atento fotografo meia boca a imortalizou no ar.
Um vazio.
Felicidade em versão cinza.
E até hoje ele espera o tchibum! E gargalhadas logo após.

Morfo e chá com açucar.


Eu senti o gosto da depressão. Sabe qual é o gosto de perder um filho, minha mãe?
Eu falo de paladar, sabores e desabores minha mãe. Hoje, eu sentir o gosto do maldito, das horas que chegam inexplicáveis, que me corroem o peito vivo com cheiro de benzina fria e ice kiss de menta.
Era um gosto tão simples, o gosto que eu não irei mentir em hipótese alguma, porque eu só escrevo para falar a verdade, mesma que a verdade saia turva e ninguem entenda.
Não soube decifrar qual era o gosto exato do mal, do sentimento "fundo do poço", não soube porque sou um bocado disperso, e quase me perco agora... Mas peguei a linha. Vamos pôr um ponto de continuação e continuar o relato verdadeiro em outra linha que quase não se mostra, não era nítida, como deveriam ser todas as coisas?
Ontem, eu estranhei o espelho novo comprado por alguem que mora comigo, não estranhei o simples espelho novo comprado na feirinha suja, onde abriga frutas tropicais, cumplices dos mijos dos homens bêbados, homens-cães que mijam em qualquer lugar. E eu digo; escolhendo as palvras, que na hora de ler tudo se resume.
Estranhei a nitidez do meu rosto velho e barbudo, guardião de cravos e espinhas, sombrancelha mal feita, e enquanto ando, vou formando seios tortos nas meninas ninfas, enquanto o sol se põe e eu as observo com um certo desejo peculiar. A minha boca que anda mais descascadas do que as paredes da minha alcova. paquera.
Eu disse alcova! Ouviram? Ainda não cova. Não sou o vampiro de Curitiba, nem de lugar algum! Não sou vampiro.
As nuvens negras cor de sua roupa percorre a cabeça da menina que gritava: "Eu não quero morrer assim! Eu não quero morrer assim!"
E eu ria do seu riso, que era um sorriso engraçado, um tanto grotesco e desesperador, ela escondia os seus dentes com o pão, comia olhando os móveis calados da sala, e os imóveis falantes da varanda, ou da sacada, os dom´s, os belzebú´s da vida e da morte.
Eu gostaria de ver a reação das pessoas que me lêem nesse exato momento, nesse exato texto, que cheiro tem? estás impaciente leitor? me poupe, eu sou disperso e ainda uso thc. Não cobre de mim, a roupa que eu não posso te dar, estou ouvindo a melhor musica que não me eleva, no fim, ela acaba súbita, e eu fico querendo mais... e eu fico querendo algo...
Onde estava... Onde estava?
Passe os olhos no inicio e continue o fim, dê cabo nele antes que ele dê em você. Estava no gosto!
Tudo me parece tecnicollor, e os sentimentos tem cheiros e gostos sim, o gosto que eu sentir do mal era um gosto de pús, mas com a textura pastosa do molho da salada boa que eu comi hoje no almoço.
Xuxu, preciso parar de escrever e me alimentar mais, volte outra hora por favor, estou cansado.
Por ande eu andava, eu me furava com adagas...
Eu falei adagas!
Ainda terei adegas... Não sou piegas, e não quero rimas! Para o inferno a vida rimada! Prefiro a prosa à poesia!
Ponho um fim, e tudo se resolve. Dou cabo de mim!
E quem não gostou, que vá para a puta que o pariu!